Recentemente, tive o grande prazer de colaborar com o projeto Oxford Bibliographies, com o verbete Material History of Surgery.
A plataforma Oxford Bibliographies é uma ferramenta excelente para quem está começando a explorar um novo campo de pesquisa. Por meio de uma introdução geral e, em seguida, de pelo menos 50 referências comentadas, um pesquisador experiente oferece um panorama do que é essencial para conhecer os textos clássicos e mais relevantes sobre determinado tema.
No meu caso, contribuí com um artigo sobre a história material da cirurgia, como parte da seção de História da Medicina. A introdução — disponível inclusive para não assinantes — apresenta um panorama conciso do tema, e a versão completa discute em mais profundidade instrumentos cortantes e de sutura, elementos indispensáveis à prática cirúrgica.
Sem dúvida, a seção que mais gostei de escrever foi a dedicada à metodologia. Na minha experiência, é muito comum que historiadores tratem os objetos históricos de forma descritiva, como se fossem apenas manifestações ou sintomas de práticas socioculturais — no máximo, testemunhas silenciosas do passado. O que proponho, em diálogo com uma historiografia já bastante consolidada, como aponta Thomas Schlich , é que esses objetos sejam vistos também como agentes ativos, capazes de produzir cultura e impactar diretamente a sociedade.
Um exemplo trivial, mas revelador, pode ser encontrado na dimensão sensorial: pensemos em um aparelho de anestesia. Quem poderia negar o impacto que ele teve tanto para o indivíduo — que, antes disso, precisava morder um pano para não ferir a própria língua — quanto para a própria ideia de cirurgia? A partir de meados do século XIX, tornou-se possível dormir durante o procedimento, e desse sono, quem sabe, acordar para ver o resultado da intervenção — ou não acordar mais. O fato é que esse aparelho, que já foi um trambolho nas salas cirúrgicas, ontem e hoje e quem sabe por muitos anos no futuro, transformou radicalmente a prática médica: sem ele, o ambiente operatório era marcado por gritos lancinantes e pela necessidade de conter fisicamente os pacientes em dor extrema.

Foi um enorme prazer colaborar com esse projeto — não apenas pela oportunidade de revisitar meus arquivos e relembrar os fundamentos do campo, o que foi uma experiência deliciosa, mas também por contribuir com um material de grande valor pedagógico para jovens historiadores e historiadoras interessadas na história da medicina.
Espero que você me dê a honra de ler esse trabalho!
